27.2.09

sobre imensidão e terremotos (I)


(tuta- olhares.com)


sim. foi ciúme.
alguma coisa que cisme. alguma coisa que some. que faça um com um.

sim. foi ciúme.
alguma coisa que sobre. algo que também seja!
algo que sopre e faça um vendaval nas nossas penas.
algo que desperte. algo que acerte o alvo. que aceite o riso e o não ser.
que me descabele na mais alta madrugada e deseje.
só deseje ser algo que deve. que já pagou. algo que aqui é nada. e quando anoitece a madrugada...
dezenas de novos amanhãs anunciam
que o dia chegou e é tarde.

tarde ou cedo tanto faz.
cedo ou noite; nunca mais.
o dia cíclico. a tarde mansa. o dia que amanhece.

amanhece esse dia e a Cinderela acorda.

acorda para ouvir o ronronar da corda.
acorda, Cinderella pra ouvir...

-Cinderella já acordou?

-...

- Cinderella acordou? O que será que Cinderella; sim. a minha Cinderella viu num homem tão insensível?

- mas pq vc diz isso, amor?

- ...

N.A. - não existe objetividade. não existem convenções sociais. não existe machismo, feminismo e nem absorventes íntimos.
não existem estrelas no céu.
não existe céu sem estrelas...
o sol está lá e estala.

eu estou aqui e vivo.
não posso levar a culpa e nem carregar o peso do mundo pelos meus atos.

não devo me abster dos meus sentimentos, meu prazer por outros.
devo pensar em mim, agora.
devo pensar em mim;agora.
tenho tentado não pensar.
tenho pensado em desfalar.
tenho querido des-sentir.

Ando precisando me pensar.

26.2.09

Só Roberto SALVA!!!!

Sua Estupidez - Roberto Carlos

Composição: Roberto Carlos / Erasmo Carlos

Meu bem
Meu bem
Você tem que acreditar em mim
Ninguém pode destruir assim
Um grande amor
Näo dê ouvidos à maldade alheia
E creia
Sua estupidez não lhe deixa ver que eu te amo
Meu bem
Meu bem
Use a inteligência uma vez só
Quantos idiotas vivem só
Sem ter amor
E você vai ficar também sozinha
E eu sei porque
Sua estupidez não lhe deixa ver que eu te amo
Quantas vezes eu tentei falar
Que no mundo não há mais lugar
Prá quem toma decisões na vida sem pensa
Conte ao menos até três
Se precisar conte outra vez
Mas pense outra vez
Meu bem
Meu bem
Meu bem
Eu te amo

Meu bem
Meu bem
Sua incompreensão já é demais
Nunca vi alguém tão incapaz
De compreender
Que o meu amor é bem maior que tudo
Que existe
Mas sua estupidez não lhe deixa ver
Que eu te amo

Sobre demolições e água na boca (I)


desejos mergulhados numa fonte submersa
cachoeira que molha a nuca
e seca o suor dos pensamentos


travesseiros de água
em travessuras de língua macia
mãos e carícias que revelam
o que pode estar oculto
há tempos demais

diversão instantânea
num cruzar de olhares
num fechar de olhos
num encostar de bocas
e narizes

emoções absorvidas
num grito alto

fonte que jorra sentires
em via de mão dupla.

encontro de singularidades
pandeiro, tambor e tamborim
ritmo agitado
de uma música que se canta
com formigueiro nos pés
e dedos apontados para o alto.

[purpurina e piração]

liberdade revelada
numa tarde de carnaval.

o amor pode nascer assim
numa fonte submersa,
na cachoeira
ou no canto de um beija-flor.

18.2.09

Sobre cama, mesa e banho (VII)


Adoro o jeito que você me cheira de manhã.


Parece conferir sua presença em mim como um animal faminto e ciumento.

Dormi com seus braços de travesseiro e o seu corpo se esfregou ao meu por toda a madrugada e inclusive agora a pouco.

Você cheira minha pele e quando a gente percebe, começou tudo de novo. É difícil frear a vontade de continuar, mas precisamos tomar banho e café, mas eu não sei porquê a gente sente fome, sede precisa se alimentar.


Mais cinco minutos, por favor... me abraça.


Não quero lavar você de mim.

11.2.09

Um casal em duas versões que se completam (por França e Reka)

Primeira versão

Não quero envelhecer

Concluindo que

Qualquer mulher

Ao meu lado

Deverá arrumar minha cama

Ao amanhecer

E lavar a louça

E lavar a roupa

E lavar a casa

E lavar até o último dia

O meu passado

E lavar a todo custo

O meu corpo

E limpar do meu rosto

Toda a irregularidade

De ser enfim

Homem.


Alexandre França


Segunda versão


Não quero envelhecer

Concluindo que

Para qualquer homem

Ao meu lado

Deverei arrumar sua cama

Ao amanhecer

E lavar a louça

E lavar a roupa

E lavar a casa

E lavar até o último dia

O seu passado

E lavar a todo custo

O seu carro

E limpar do seu rosto

Toda a irregularidade

Em ser enfim

Sua mulher


Reka

10.2.09

???????

Love is an ugly, terrible business practiced by fools. It’ll trample your heart and leave you bleeding on the floor. And what does it really get you in the end? Nothing but a few incredible memories that you can’t ever shake.

Le verbe aimer est un des plus difficile à conjuguer: son passé n’est pas simple, son présent n’est qu’indicatif et son futur est toujours conditionnel

- Jean Cocteau
After they broke up, she continued to send him things in the mail occasionally. Nothing big– CD’s she made of favorite music, new books she read and liked, small stuff. She did it simply because she thought he would like them too and she wanted to share even though they no longer had contact. According to the rules of romance you’re not supposed to do that after you’ve stopped seeing someone, but who made those rules? She had loved him and they were very happy once. Wasn’t that reason enough to send things now and then that she believed would make him glad? They had gotten along so well when they were together, she was certain he would understand now why she did it. I liked this and I think you will too. I remember the things you liked. That’s all. Nothing more or less. I hope you enjoy it. But he didn’t understand. Eventually he wrote her a short curt note saying “I don’t know how to feel about these things you’ve been sending me.” Once they’d told each other real secrets about themselves and confessed to weaknesses they tried to hide from the rest of the world. For a short blessed time, they’d felt both safe and at home with one another. Despite that intimacy, now she had become only a stranger bearing gifts and of course we should always be suspicious of them.

jonathan carroll

sobre escaladas e maremotos (IV)


insatisfação despejada com a mão espalmada na cara
torta de chantily que deixa bochechas meladas
pedaços de vidro encravados no coração

estar com você
sem você

difícil prever este voo
uma vida ou o resto dela

com você
sem você

talento para mal interpretar meu atos
entender tudo da forma mais difícil
de um jeito sem nexo

com você
sem você

mania de abrir feridas
num peito que pulsa,
te ama, deseja...

você
sem você

mistura de cores
e corpos

atitudes e pensamentos tortos
num gole sem volta
o quabrar de óculos no asfalto
um espera e um medo contantes


eu com você
sem você

um não saber sem resposta

nada
absolutamente nada
foi perguntado.

9.2.09

Polly Scattergood

I HATE THE WAY


I hate the way I cry when you say you miss me
but I love the way you hold me when I sleep
I hate the way I bleed each time you kiss me
But you say hey, sleeping beauty, go back to sleep

We had pennies in our pockets,
we had hope in our eyes,
you said, girl, you got a million different faces,
so why d’you put on that disguise
well take what you want cause I’ve got nothing,
pass me some pills, I’ll go to bed,
but however much I toss and turn I feel a dark place up ahead

Some nights I just sit right here, I remember, I just remember
before it all got lost up in the mess
he said, “Not all men are bad, and I am not like your dad,
and I will hold you, even though you’re slightly mad,
cause I am not a man who will ever break you.”

We had pennies in our pockets,
we had hope in our eyes
you said, girl you’ve got a million different faces,
so why d’you put on that disguise
well you can take what you want cause I have got nothing,
pass me some pills and I’ll go to bed,
but however much I toss and turn I feel a dark place up ahead

doo doo doo doo doo doo doo doo
my doctor said I gotta sing a happy tune
doo doo doo doo doo doo doo doo, do doo dn doo
but my body gave up too soon
doo doo doo doo doo doo doo doo
you know what

I am just fine ‘til I’m on my own
doo doo doo doo doo doo doo doo, ah doo dn doo dn doo
somebody please come home

I hate the way I tremble when you touch me
you’re like a needle slowly piercing my skin
I hate the way my stomach aches
and I really hate these loveless mistakes
cause I’m screaming for my rock who never picks up,
why do you never pick up

We had pennies in our pockets
we had hope in our eyes
you said, girl you’ve got a million different faces,
so why d’you put on that disguise
well you can take what you want cause I’ve got nothing,
pass me some pills, and I will go to bed,
but, however much I toss and turn I feel a dark place up ahead

doo doo doo doo doo doo doo doo
my doctor said I’ve got to sing a happy tune

6.2.09

Sobre camuflagem e pisões no pé (V)

CARTA 5:


J.,

Um pequeno poema para levar os entreveros desta vida mais na flauta.


assim como o dia segue a noite, o balanço se segue ao atrito
"tantas coisas a dizer que não disse e tantas que não deveria"
há uma maneira certa de se fazer as coisas e um tempo certo
de vê-las nascer por inteiro
tudo vai e vem
pois nada - anote- é tão severo
neste seus entreveros
ou nos dos outros


G.


RESPOSTA 5:


G.,

Como sempre, uma questão de opinião. Simples assim...

J.

Sobre camuflagem e pisões no pé (IV)

CARTA 4:


Dear J.,

O bom de todas essas palavras é o desentendimento. Naturalmente que ninguem deixa de apostar no elixir do amor e seus perfumes e delícias sejam eles de carne ou de papel. Afinal se esse sentimento não fosse o que é Dante não escreveria no fim da sua obra prima "o amor que move o mundo e as estrelas". O que eu tentei dizer - e não consegui - repassar - transmitir é que seria interessante uma investigação, um chamado para se pensar num poema, numa escrita que tivesse uma "coluna", um rio submerso que como leitmotiv guiasse a pena da poeta. Uma espécie de conversa entre a poeta e o leitor [eu]. Um desafio como fazem os repentistas no nordeste em que uma palavra puxa uma outra e assim por diante. O rio que eu iria propor, naturalmente, não seria sobre guerras nem violências, nem política mas sobre a identidade nacional, quem somos, o que somos vis a vis o exterior, quem somos nós e quem são os Outros O Brasil o que é mesmo? Durante muitos séculos nós fomos para fora para aprender, mas para aprender o que? O que os Outros tinham para dar para nós? E afinal o que somos nós em relação a eles? Apenas uma fonte de recursos e de exotismo? Ou somos mais? Mais o que? Não somos "cordiais pois não? Somos o que subalternos? Gangsters? Escravos? Tolos? Servis? O que afinal? Nossos poetas tem que copiar, imitar ou podem tb ser vanguarda? Ou somos um só planeta, um só solo dividido por oceanos e preconceitos? Quando não haverá mais nações? Quando desaparecerão os passaportes? As bandeiras? Os hinos nacionais? As Olimpíadas? As competições esportivas, simulacros desta guerra permanente?

Também olho o oceano cor de vinho e bebo água gelada e lambo sorvete de baunilha e faço comida em casa,
e olho o vôo dos pássaros e admiro o rosto das pessoas a passear na orla do mar e mais outras tantas coisa
pequenas na aparência mas grandes na seiva de sentimentos.

Abraços.

G.


RESPOSTA 4:

G.,

Tinha me jurado que a resposta de ontem seria a última para vc, pq realmente, interpretei como prepotência, pedantismo seu ficar citando grandes obras e seus meandros como se insinuasse que eu não havia lido tais livros; o que vinha me deixando profundamente irritada. - mas pela sua resposta hoje, acho que vc finalmente entendeu o meu ponto de vista e respeitou a minha opinião, por mais que novamente tenha tentado fazer a sua prevalecer sobre a minha, mas o importante é que aparentemente vc compreendeu a simplicidade dos meus sentimentos em relação à vida, à poesia e por isso... resolvi te responder.

Engraçado que também ontem, depois de publicar a nossa troca de e-mails no blog, recebi muitos outros de solidariedade falando do quanto escrevo bem e faço com que identifiquem- se com a minha escrita que não é feita com pena e sim com caneta esferográfica comum... e falando o quanto vc tentou "me derrubar" com suas citações e afins e que eu não me deixei abater. Claro que vc vai dizer que não foi sua intenção, etc e tal, mas da próxima vez que tentar se aproximar de alguém e aqui não falo só de mim, mas de qq pessoa - não fique falando de livros e trechos e filosofias, pq parece que vc está tenatando diminuir a pessoa impondo o seu conhecimento que a pessoa também pode ter (e estou falando de mim aqui), mas que para ela este conhecimento todo seja menor do que outro todo aparentemente menor mas que na essência é maior... para não soar arrogante, pedante, sabe... - muito melhor, mais simpático este e-mail seu agora do que os anteriores.

Obrigada.

J.



4.2.09

Sobre camuflagem e pisões no pé (III)

CARTA 3:


Dear J.,

Vejamos se posso provocar uma partida de idéias e sentimentos sobre o faber poético. Se isso é possível. Pois era essa a minha idéia quando iniciei há dias uma troca epistolar com Vossa Reverendíssima. Quando lemos Homero por exemplo além da qualidade das imagens e metáforas há um "rio" subterrâneo, uma espinha dorsal, os dois assuntos de seus textos são, basicamente, a guerra imperialista grega [ataque à Troia] e o retorno do vencedor [herói] aos braços de sua mulher [uma temática bem Hollydiana e melodramática] [convenhamos] Depois de experimentar Calypso e suas maravilhosas mulheres, o "conservador" Ulysses cai nos braços da velha Penélope. Portanto na Ilíada há a apoteose da violência e da guerra e as mesquinharias desse processo [intrigas] que até hoje encantam os homens. Não é a toa que Tolstoy escreve "Guerra e Paz" tendo como fundo de pano, fundo musical a guerra entre As Monarquias e Napoleão, o "usurpador", o sanguinário que se nomeia nobre colocando a sua coroa em sua própria cabeça. Como você vê, há um sistema sanguíneo que corre por baixo dos textos - digamos canônicos - que mereceria da sua parte, pelo menos uma reflexão porque - esta a minha aposta - isso poderá ajudá-la a mergulhos mais profundos, acredito. Não tenho certeza mas pode ser um outro caminho que pode atrair novas facetas para sua pena. Da mesma forma Dante realiza a mesma operação: o rio submerso é a paixão platônica entre um velho/adulto e uma ninfeta, um precursos do grande Lolita de Nabokov, esperto como ninguém ele inventa um cristianismo para poder explorar esta grande e maravilhosa transgressão.

Quem sabe vc não aprecia essa minha forma exdruxula de epístula, espero que goste e que se distraia com ela.

Abraços.

G.


RESPOSTA 3:

G.,

Não acredito numa idéia de fazer poesia com um pano de fundo sanguinário.

Sangue, guerra, bombardeios, balas perdidas, granadas e incompreensões entram em nossa casa todos os dias através de telejornais.

Todas as manhãs, acordamos com periódicos com fotos de carros incendiados e manchetes de roubo, morte, injustiças. Salvo o de hoje de manhã quando a manchete dizia que policiais haviam sido atacados por latas na praia após tentar prender um suposto fumante de substâncias ilícitas – confesso que ri da fragilidade humana e da idiotice que seria prender uma pessoa na praia enquanto turistas ingleses são assaltados por policiais e os bandidinhos e bandidões continuam à solta.

Quando o simples ato de ir à Lapa comemorar as boas notas acaba em morte e o término de um namoro vira assassinato – acho importante refletir sobre os perigos de se sair de casa e por isso, acho importante abrir uma garrafa de vinho ao lado do homem amado e me aconchegar em seu ombro para que sejam esquecidas essas notícias que despertam a síndrome de pânico que habita em nós e nos faz querer nunca mais ficar expostos à esses fatores externos.

Acredito no AMOR e sim maiúsculo, pois por mais conturbado que possa parecer amar alguém não posso permitir que meu inconsciente traga à tona ligações e imagens de AMOR e morte. Paixão e morte. Excitação e morte.

Orgasmo pode ser uma "pequena morte" no francês, mas é uma morte viva. Um círculo vicioso do renascer. E incrível o encontro, ou melhor quando encontramos aquela pessoa com quem desejamos passar o resto da vida "morrendo/nascendo/morrendo/nascendo...".

Sobre cinema, posso dizer que às vezes, sim é muito bom assistir uma película água com açúcar que toma corpo em construção melodramática holywoodiana, embora, prefira filmes irlandeses, franceses, iranianos, ingleses, italianos, neozelandeses e até porque não; japoneses, coreanos e chineses.

Quanto à sarcasmo só posso dizer que acho desnecessário e que o"Vossa qualquer coisa" só me lembrou uma vontade quase incontrolável de soltar um palavrão bem alto! Nada comparado com a sensação do primeiro castigo recebido dos meus pais que nunca existiu.

Sobre o "esdrúxula" e o "divertir-me", sim!adorei esta maneira passivo agressiva de auto-elogio.

Já te disse que nado de acordo com a maré e que tenho brevê de mergulho para saltos mais profundos. Já vi peixes, golfinhos, corais, anêmonas, moréias e até mesmo tubarões no fundo do mar e adoro Cancún, Cozumel e Angra dos Reis.

Caminho sempre sobre uma linha reta, às vezes pontilhada, mas adoro ligar os pontos às vezes. Destes livretos infantis, surgem de quando em vez, lindas figuras.

Abc,

J.

Da série: papai deveria ter me deixado mais de castigo
ou
estas definitivamente não são cartas de amor.

Sobre camuflagem e pisões no pé (II)

CARTA 2:


J,

Deixe-me re-explicar a minha profecia, digamos assim, o real é a matéria, o assunto que deveria atrair o nosso olhar, o nosso toque e a nossa escrita. A vida chamada moderna ensina os vivos a não perceberem o real já que ele já tem o seu registro, e neste sentido, a escrita é uma reprise, um fax dos trabalhos dos antepassados. Assim sendo, o desafio [pode, ouviu, não é uma obrigação] é este ensinar aos vivos a olhar o real [seja ele interno ou externo] como se estivesse sendo visto pela primeira vez. Àquela mesma mágica que os tupinambás e aimorés tiveram quando o navegador Américo Vespúcio entrou na Baía do Rio de Janeiro que não era rio e sim um golfo. Na época, um escaler ia puxando a caravela [as velas estavão arriadas, mortas] e o único barulho era dos remos a bater na água, numa espécie de música de Villa Lobos. Gide tem uma bela frase que diz o seguinte "Ninguém se deixa compreender rápido".
Assim o mistério e o ocultamento são as trombetas que atraem os ouvidos longínquos e alheios que andam a passear pelos desertos e planícies deste planeta em extinção chamado Terra.


Tomando outros dois exemplos. A "Ilíada" e "A Divina Comédia". O primeiro tem sua espinha dorsal no retorno de um herói aos braços de sua amada [convenhamos que numa visão machista] é esta linha de Ariadne que conduz os versos, isto é, é o real a centelha do poetisar. Já na "Divina" trata-se do trabalho de resignação, de elaboração de uma paixão não realizada no real mas realizada poeticamente. Uma apoteose do amor espiritual baseado no olhar que o poeta teve ao ver beatriz entrando em uma igreja. Um pouquíssimo que alimenta quinze mil versos. Um dos maiores pleonasmos da literatura [do sonho, segundo Freud] ocidental só comparável ao feito de Sherazade e Gilgamesh.

Minha escrita foi na direção de uma aposta: e se...e se a tua pena se voltasse para a fotografia desses minúsculos
movimentos de beleza no real que produção sairia dessa via? Que metamorfose ocorreria? [Ovídio] Redizendo e recosturando a aposta: se passasse de Cyrano de Bergerac para Ovídio ou Homero que escrita [que dizer o mundo ] sairia? Minha contribuição. Minha curiosidade foi nesta direção. Uma espécie de pedido de salto triplo para uma poeta.

Espero que com essas palavras o meu foco tenha saído do fel [que não houve] para o mel.

ABçs,


G.


RESPOSTA 2:

G,

Escrever sobre o amor não propositada, gratuitamente e na maioria das vezes dentro do âmbito do real, do que estou passando, sentindo, vivenciando, são sentimentos raramente buscados no mundo da imaginação.

Posso dizer com propriedade que a construção de frases não é de nenhuma forma pensada com linearidade e sim, acaba sendo fruto de uma pescaria interna que faz algum sentido quando se percebida a pura essência. Um leve toque de baunilha num pavê de chocolate, por exemplo.

Quando simplesmente a primeira colherada, a que derrete na boca, nos remete à lembranças da infância, da noite anterior, do último Natal e até mesmo (com o perdão da má palavra) de um pé na bunda. Esse sentir, pode ser, para os que nunca experimentaram o pavê da Tia Fulana algo que pode despertar curiosidade, vontade de experimentar ou para os que são sobrinhos da Tia Fulana, um conforto ou o despertar de um prazer nunca antes percebido.

Quando penso (no que você insiste como REAL) vejo que não podemos ser maniqueístas ao ponto de acreditar que essa realidade é única até porque de duas pessoas descrevendo a mesma cena, certamente nascerão textos completamente diferentes, pois, como numa fotografia, os olhares serão sempre diferentes.

Contrate dois fotógrafos para a mesma festa e nunca existirá um click igual ao outro, mesmo que os dois captem a mesma cena. É como atravessar uma rua, pegar um ônibus ou deitar-se – mesmo que as ações façam parte do que chamamos hoje de "rotina" essa mesma "rotina" não pode ser taxada de igual.

Recentemente escrevi um texto e postei no blog e depois recebi o e-mail de uma menina, bem mais nova que eu que disse que consegui descrever com precisão uma situação vivida por ela e na verdade, esta situação estava descrita exatamente da forma que eu vivi, com toda a carga que a situação possa ter. Ela descreveu como incrível até a minha descrição das 14 ligações que dei para um certo celular que no final estava guardado numa gaveta e no que o fato de não ter sido atendido despertou em mim. Ela disse que até o número de ligações tinha sido o mesmo e por isso, insisto que; dirigir, acordar, dormir, fazer amor nunca despertam as mesmas sensações e mesmo que parecidas... nunca são iguais.

Os conflitos e intensidade dos mesmos é variável, assim como o que sentimos pelas pessoas, sejam elas, amigos, conhecidos, namorado, marido, pai , mãe, antepassados, etc.

Por mais que nossa personalidade e olhar sejam modificados ao longo dos anos, acredito que exista alguma memória, como se fôssemos constituídos de um chip ( e não estou falando de ufologia e sim de origem). Nos genes carregamos a história de um povo, duas famílias e percebo que dessa "sopa" surgem letrinhas que vamos ligando com o passar dos anos, nas épocas de despertar. O amadurecer é o que fixa em nós as preferências de um ou de outro por determinada coisa ou não, por isso, uns preferem os Beatniks e outros os Parnasianos ou os modernistas. Uns arriscam-se numa poesia escura outros mergulham no mar. Eu sempre preferi o sol, mesmo quando noite.

Enfim... a noção de real é muito particular de um ou de outro. E o que para um pode parecer minúsculo, para outro pode ser um monstro e por aí vai. As pontas de Iceberg são maiores para os míopes, menores para os que têm hipermetropia e um borrão para os com vista cansada, isso numa comparação tosca e simplista. Uma maneira de enxergar longe da psicanálise e baseada apenas na dificuldade de visualizar e na necessidade de utilizar óculos de correção, mas todas as formas de se ver, ouvir (estar no mundo) representam algo inclassificável e por isso fabuloso.

Da mesma forma, conhecer um trabalho apenas por uma lente, no caso, o blog é uma maneira simplista de se construir uma opinião sólida em cima de um trabalho de uma vida inteira. Faço parte de grupos de poesia, aqui falo de performance, de rua, de palco, tenho meu trabalho com os grupos, o solo, o livro e alguns blogs (o meu e outro onde escrevo aos domingos). Sou Ratos di versos e Madame Kaos. Acordei num Iceberg em 2008 e realizei meu sonho de publicar e T. não mexeu em nenhuma vírgula dos meus poemas e me convida sempre para ser "prato principal" da Ponte. É como não julgar um livro pela capa, entende?

O blog é um laboratório, onde experimento. O livro é a "personificação" dessas experiências e a performance é a vida que os poemas mostram para quem os aprecia ou apenas ouve. É sempre uma troca e sempre bom, mesmo quando ruim. Mesmo quando com medo, mesmo quando o tremor invade e as luzes se apagam.

Gostei do salto triplo. Nunca fui muito atleta, mas sempre me joguei dos abismos e encontrei as molas no fim do penhasco, assim como muitas vezes também, o pote de ouro no final do arco-íris e os duendes, são sim, muito simpáticos.

Abraço,

J.


Da série: papai deveria ter me deixado mais de castigo
ou
estas definitivamente não são cartas de amor.

Sobre camuflagem e pisões no pé (I)

Carta 1:


J,

Através de T.C. da Libris entrei em contato com sua escrita. No blog sousachet. Faço uma sugestão.
Não seria mágico se vc usasse suas habilidades de ver o que acontece no mundo? Esta saída de ego para o real
pode revelar pepitas, facetas. Uma poeta maravilhosa neste sentido foi Elisabeth Bishop. Leia-a. Tenho certeza
que vc irá aprecia-la.

Abraços.


G

RESPOSTA 1:


Olá G.,

Sim, T. é minha editora e grande amiga.

Recebi o seu e-mail com grande surpresa e ao mesmo tempo, estranheza. Não que não receba críticas bem (as construtivas sempre) e as outras (são tão raras que nem me lembro da última como a sua), mas realmente me impressionou o tom formal e de certo modo "pejorativo" para não dizer outra coisa, da sua sugestão.

Para mim, mágico é meu estado de espírito e as sensações que a poesia "causa". Minha habilidade de ver o que acontece no mundo não resume-se ao meu EGO e sim, às experiências vividas por mim, o que me causa dor, o que me espanta o que acho importante sentir e passar para o papel. A poesia é maior do que qualquer crítica social, do que qualquer bobagem que nosso presidente possa dizer, do que a crise financeira mundial e até do que a guerra na faixa de gaza e a posse de Obama.
A poesia expressa beleza onde achávamos que só havia lixo e incompreensões e por isso não concordo quando vc "sutilmente sugere em tom de sugestão" que a MINHA POESIA gira AO REDOR DO MEU UMBIGO, pois não gira. Ela nasce de uma vivência e com a observação do entorno, passa a fazer parte de qualquer cotidiano, vivência ou experiência de outro. Daí tantas meninas, mulheres e homens, perceberem na minha poesia uma facilidade de explicar sentimentos ou qualquer outra sensação que na maioria das vezes seria impossível se explicar.
Já lí a poeta sugerida e sim, aprecio a poesia, mas é a poesia dela e não a minha. Não vou ler ninguém para "pescar" referências, pq senão a minha arte não seria própria e daí por diante...

Sachêt é meu apelido, portanto... SOUSACHET... (????!!!)

Abç,

J. H.


Da série: papai deveria ter me deixado mais de castigo
ou
estas definitivamente não são cartas de amor.