28.1.09

Sobre sonhos e sopro (VI)

sem você é difícil viver
morta durante anos
até que
seu beijo subitamente
despertou minha fotossíntese
e fez da poluição
oxigênio
da fumaça
sol
da sombra
gosto

ainda com pernas e braços dormentes
levantei
e hoje mesmo sabendo-te,
meu
estou de pé à sua frente
e permito-me estremecer
e sentir saudades

sem você é difícil viver
e estar morta não é mais
uma opção.

27.1.09

Sobre cama, mesa e banho (VI)

no calor do quarto
barulho da chuva

lá fora
movimento e ilusões

carimbados no lençol,
altura e peso
unidade impressa
no colchão

gotas de suor
escorrem como tinta plástica
tingem nosso interior
alimentam nossos poros famintos,
sedentos,
com sede.

tenho sede de você
como o alcólatra impedido de dar o primeiro gole

preciso beber-te
aos litros
esvaziar todas as garrafas
uma a uma
em um curto pedaço de tempo

tudo o que você faz me hidrata
deixa ofegante,
mas nunca é suficiente estar em ti
quero mais
sempre mais!

é uma vontade que nunca passa
um vício, um hábito bom.

seu corpo, sua pele, seu cheiro, meu ciúme.

e tanto amor a gente cria
que a qualquer momento
um monstro pode surgir
no meio do nosso estômago
e falar uma língua incompreensível

é possível que ele seja
a personificação do enorme desejo
que nos invade como facada
e fere nossa alma
a cada uivo mais alto,
a casa sussurrar de palavras sujas no ouvido

no sentir de cada sopro de vida
que sua boca venta em meu corpo.

Sobre rios de lama e borboletas (I)

(olhares.com)

Querido (Z),

Vontade de escrever uma carta sobre qualquer das coisas que não se explicam por querer, mas devem ser explicadas porque são necessárias.
Desejo de exprimir em frases feitas, palavras alinhavadas com sentimento.
Preciso falar de coisas que pairam no ar como o novo "vôo" sem acento circunflexo.
Deslizar na esteira da academia e pisar em cima do que foi deixado para trás.
Saborear o que ficou nas entrelinhas e tudo o que eu devia ter falado para você cara a cara naquele nosso último encontro.
O coração volta a bater quando te penso, quando lembro da nossa primeira vez, do meu irmão dormindo como anjo na cama de cima e nós dois ali entregues um ao outro e no quanto isso, que de tão importante, se perdeu no espaço.
Penso no quanto deixamos de ter controle sobre nossas vidas naquele quando em que elas se despediram sem ao menos um beijo na testa ao virar daquela esquina depois da festa de natal. Em nossos olhares que desejavam ser espelho retrovisor e nas mãos suadas que deixaram de se encontrar. O meu corpo não mais sente seu calor e tudo que a gente viveu, deixou parado num tempo sem minutos, horas ou segundos.
Paradas no espaço ficaram as fatias de bolo que a gente não mais dividiu e todas as lágrimas que escorreram de mim como orgasmo e não mais foram posar no seu colo.
O seu ombro nunca mais tive para chorar e o seu sorriso nunca mais deixei me fazer cócegas nas bochechas.
As bonecas tchecas deixamos de comprar, os banhos de banheira esquecemos e as madrugadas a nos embalar na rede perdemos de vista.
Todos os invernos quentes e suores frios e os lábios seus que nunca mais tingi com meu batom. Os meus cigarros que você não acendeu e as noites de esfregação e disfarce na piscina do condomínio da praia, os meus porres que você não segurou, minhas viagens e os poemas que nunca mais dediquei para você.
Queria relembrar todos os sonhos que tive contigo e te contar detalhadamente todas as passagens remontando diálogos passo a passo para tudo depois terminar numa bela risada ou numa trepada animal.
Queria voltar a ser sua qualquer coisa, mas me deixei ausentar nos seus momentos felizes enquanto você se esquivava dos golpes certeiros da minha espada triste naquela última manhã de sol.
Percebo agora que ficou muita coisa por dizer e por sentir e o trem já passou. Eu saí tão de repente da sua vida para me entregar para outros braços e tentar construir uma casa sem paredes, para mim, que tudo desmoronou como o teto daquela igreja evangélica e agora me vejo aqui, sozinha esperando você chegar, mas você nunca vem e eu nem tenho mais seu telefone para te acordar no meio da noite.
Você, ao contrário de mim, construiu um belo prédio com varandas e tem churrasqueira, cama king size e tv de plasma para assistir filmes que nunca vimos. Tem outros ombros para dividir suas angústias e outras bochechas onde esfregar o seu sorriso.
Eu, ao contrário de ti, procuro em outras esquinas seus abraços e estou presa numa história sem final feliz. Deixei o sorriso do gato da Alice escondido atrás da estante e te dou agora meu coração e mais forte abraço.

Sinta- se melado com meu gloss mais pegajoso.

Beijos da sua sempre,

(Y).


(*) da SÉRIE: " esta poderia ser mais uma carta de amor e é.

23.1.09

Sobre paisagem e movimento (VI)

para Célio Porto (Meu irmão)

sinos que não tocam
e uma voz longinqua
dizendo sim.

ela grita
e ele
quer mais

ela canta
ele dança
e o ritmo é lento.

ele pensa em perfil
e ela vê tudo
em furtacor

as vozes se misturam
e tudo é puro
não

ele oculta sentires
ela sofre verdades
e há sempre um muro
a dividir a estrada

um lado é mão inglesa
outro,
contramão

tudo senão
quando pensam

tudo fogueira
quando nasce

mãos que não se tocam
lábios que se beijam
existência simples;
amor

é o que sinto
de onde venho
em não sei quandos
olho para ele

um ponto colorido na parede
um sorriso que ilumina

sorte sempre ter por perto
um pote de outro
ali,
bem no fim do arco-íris.

21.1.09

Sobre infância e liberdade (III)

Da série: Esta não é uma carta de amor, por mais que se proponha a ser.

Querido R.,

Certamente você vai estranhar depois de tantos anos receber um e-mail pessoal meu.

Isto vai te dar, possivelmente, a mesma sensação que eu tive ao acordar hoje de manhã e me aperceber que sonhei praticamente a noite toda com você.

O conteúdo do sonho não vale a pena falar até porque eu não lembro direito do mesmo, mas remeteu-me a várias situações passadas/vividas por nós ao mesmo tempo em que ocorreu a mais diversa situação e com várias pessoas (conhecidas) em volta de nós, enfim...

Lembro-me de uma enchente e tudo começou por causa dela. Você surgiu no meio da tempestade para me salvar e realmente não posso te dizer e nem imaginar o motivo para o meu inconsciente ter colocado você ali na minha frente com uma corda na mão e depois, nem como, esse mesmo, meu inconsciente conseguiu colocar a gente num carro comum que andava no meio do aguaceiro até nos deixar num lugar seguro com muita gente em volta. Esse lugar tinha o pé direito muito baixo e várias portas que de cada vez abertas, surgiam pessoas. Nessa algazarra, conversamos. Do conteúdo dos diálogos, não lembro, só de que foram importantes. Não é possível me fazer lembrar de que forma uma palavra costurava-se à outra e a outra até meu acordar hoje de manhã.

Não consegui entender o porquê de você ter surgido no meu sonho, mas hipóteses existem e, não sei por quê, também achei importante escrever este e-mail pessoal em forma de carta para você, depois de tantos e tantos anos sem nos dirigirmos a palavra, nem em telefonemas, nem por e-mail e nem pessoalmente.

Uma das hipóteses é que você também tenha sonhado, mesmo que remotamente comigo e nesta noite nossos personagens tenham se misturado um no sonho do outro. Pode ser também que você tenha pensado em mim e esse tenha sido um trabalho da “Matrix” para fazer com que nos comunicássemos, mas a mais plausível, para mim ao menos, para você ter aparecido no meu sonho tenha sido porque recentemente e bem recentemente falei de você para o meu irmão e contei a nossa história, não que me assombre, mas foi importante e, não sei, me deu certa nostalgia lembrar da última vez que nos vimos, daquele Natal aí em que nós, as únicas pessoas vestidas de mesma cor quase não se falaram e trataram-se, talvez como estranhos; da sensação esquisita que tive, e, ao mesmo tempo, o fato de eu me lembrar e linkar todas as situações importantes em que você esteve presente na minha vida e o meu pensar em todas as situações importantes da sua vida em que eu estava presente e em tantas outras em que me fiz tão ausente...

E pensar agora que estou escrevendo, em todos os "acordos" que fizemos, e no fio de lágrima que me escorre dos olhos agora ao lembrar do “Vô P.” e de como ele se foi “desconfiando”(lembra da frase que ele sempre falava? Eu lembro.) e de como os “planos dele” não deram certo e de como a nossa vida mudou e do quanto nos afastamos (mesmo sem querer, sem perceber) e agora que me dei conta disso, essa minha necessidade de, talvez, falar tantas coisas, mesmo que elas não sejam nenhum pouco significantes e nem significativas para você e nem mesmo um tiquinho importantes no seu momento de vida – ao mesmo tempo em que – essa minha necessidade de exposição que não é uma necessidade de exposição crua e sem sentido, seja, talvez, a atitude mais corajosa que me vejo ter depois de anos em que me dediquei a realizar velhos sonhos de infância e resgatar amizades, fazer novas e me tornar um ser humano melhor.

Pensar agora, nesse tempo todo, no porquê não te procurei para “dizer/escrever” essas coisas e no porquê de estar fazendo isso neste momento, e na forma de fazer isso, assim tão de repente e, com tanta carga de tanta coisa... mas meu coração bate mais forte a cada digitar e eu sinceramente não gostaria de estar me sentindo assim e por mais que eu ache que não deveria, eu preciso escrever o que escrevo e te mandar esse e-mail ( a sorte é não ser mais de meia-noite, pois senão, não conseguiria fazer as contas do “google”, mesmo sóbria). Engraçado que também não sei mais se o seu e-mail é o mesmo e não tenho o seu telefone para confirmar seu e-mail e não acho que esta carta deva ser enviada pelo correio.

Neste momento, há um furacão dentro de mim que me impede de descolar os dedos do teclado, os olhos da tela e a bunda da cadeira para ir almoçar e sim, estou tirando meu horário de almoço para te escrever, até porque não conseguiria comer nada porque toda a minha fome, neste momento, resume-se a todo esse senão e a tentar falar todas as coisas que não estou conseguindo dizer agora.

Este momento, resume-se a todas as palavras não ditas e sentimentos não sentidos envoltos numa carga de tudo o que já foi dito e vivido e a tudo que quer ser explicado, mas não deve e a tudo que já passou com a correnteza (enchente) e a tudo o que ainda dança no ar tão rarefeito que se permite respirar.

Talvez isso tudo que estou escrevendo não signifique nada, ou signifique muita coisa, ou tudo. Talvez isso tudo seja entendido ou não seja necessário ser (entendido) ou talvez tudo isso não seja necessário se falado e poderia ter sido suprimido como todas as palavras não ditas e os olhares não dados em todos esses anos que ficaram para trás.

Talvez o meu retorno de saturno esteja ocorrendo fora da época, eu esteja “amaluquecendo” ou já seja ou esteja completamente maluca, ou tão sã, que seja por isso que esteja precisando te escrever e contar que sonhei com você esta noite e não sei o por quê.

Sei que isso tudo não necessita de explicação e nem resposta, até porque sou eu que preciso escrever essa coisa toda e talvez isso seja tão confuso ou fora de hora ou o momento pode estar sendo o certo para te escrever/dizer tudo isso ou talvez isso não seja nada.

Peço-te perdão, caso isso tudo te confunda e te mando o meu mais belo sorriso caso entendas tudo, quando, eventualmente, você leia este e-mail, mesmo que talvez nunca tenha certeza que você o leu. Caso leias, saberei, pois um beija-flor, sim, sempre aquele, o nosso beija-flor vai vir aos meus ouvidos e contar. Ele é tão eficiente que até uma foto Polaroid vai me trazer do seu rosto no momento da leitura.

Enfim, sem mais me explicar e ou confundir, despeço-me de antemão te desejando um Feliz Aniversário, mesmo que falte ainda mais de um mês para essa data.

Beijo da sempre,

P.

(*) Isto é uma obra de ficção, mas representa a verdade.

(*)Todos os nomes foram substituidos por letras que podem ser as iniciais verdadeiras de cada participante ou não, para que a identidade de cada indivíduo ridículo que ama genuinamente fosse preservada, pois há muito poucas pessoas assim neste mundo e talvez eles sejam todos de outro planeta e estejam fazendo pesquisa de campo no Brasil

20.1.09

Sobre sonhos e sopro (IV)


Da série: Procuras





(olhares.com)

é noite, faz frio e ela acabou de fazer o batom vermelho deslizar pelos lábios. sem duplo sentido ela sacode os cabelos e ajeita o soutien. olha pela última vez no espelho, dá um gole no vinho, tira a chave do trinco e bate a porta.
está agora no hall e impaciente, acende um cigarro antes do primeiro trago. o elevador chega e ela sem pressa coloca a bolsa na porta para prendê-la. os outros que esperem, não estou atrasada, vou terminar de fumar: - ela pensa.
entra no elevador aperta o botão do “T”, dá boa noite para o porteiro e se entrega para as luzes da rua.
procura a chave do carro na bolsa, entra, ajeita o retrovisor, retoca o batom, prende os cabelos (para dirigir é melhor cabelo preso;ela sabe).
liga o carro, o rádio e começa a cantar enquanto procura algum retrato no asfalto, alguma lembrança, um rumo,
o caminho.

16.1.09

sobre escaladas e maremotos (III)


por mais que me seja fácil

difícil ou impossível admitir

adoro brincar de “esconde-esconde”


esconder sentimentos

e ser pega a fazer travessuras

mostrando o que não se deve

assumindo

“eu te amos” em cada baixo de escada,

traseira de estante, pé de cadeira.

sempre eu, escondida

sendo pega pelo acaso

capturada por imãs invisíveis


a que cochicha alto

a que ri primeiro

olha nos olhos


a faminta,

a sedenta

a que é difícil compreender

a que quer ser entendida

e paga mico

a que desaparece


este não é um poema de amor

e nem de dor


sou aquela que tem medo da dor,

da tatuagem

da cirurgia plástica,

do atropelamento

e, é cheia de coragem quando se trata de corte no dedo,

pé torcido,

dente cariado,

buraco no coração.


não tenho medo do pulo do abismo;

e nem da queda.


por mais que me seja fácil, impossível ou difícil negar

teu cheiro me enlouquece os sentidos

cola nos meus cabelos feito chiclete

impregna meus poros

a sensação do teu beijo é o melhor dos desmaios

o toque da sua pele é veludo de mais alta qualidade

e suas mãos fortes, suas carícias o lençol mais macio

seu corpo no meu é um manto de luz

uma manta de paz


é kama-sutra, yoga,

e tudo mais de místico que possa ser criado

para elevar a alma


o que escrevo agora, não é um poema de amor, mas um desabafo de amor


o que escrevo é o que sinto,

o que sou

quando sozinha e quando com você


o que sinto não é descartável como saco plástico,

absorvente íntimo

camisinha


o que sinto é o que sou

o que escrevo é um todo maior

sem qualquer dimensionamento


o que sou é o que sinto

enquanto escrevo pensando em você

com você, longe-perto de você,

enquanto pensamos, sofremos,

brigamos, sentimos

e nos permitimos ser iguais

mesmo com todas

todas,

todas,


TODAS!!!

as diferenças.

13.1.09

sobre janelas e portas abertas (I)


pode ser loucura essa vontade de gritar pela ruas seu nome e também que te amo, te amo, te amo, amo, amo, AMOOOOOOOO.
pode ser insanidade esse precisar que me impede de pregar os olhos e me faz puro desejo de adormecer ao seu lado todas as noites. esse segurar minhas lágrimas doces e puras num travesseiro de plumas e sonhos e tempestade de algodão doce
em todos os momentos em que te procuro
e quando não acho,
espero.

Sobre agulhas e tempo (VI)


Para Maysa Monjardim


parte de mim é o que sou
outra parte é o caminho a seguir

parte de mim é um pouco
outra parte é tudo o que sinto,
de onde venho e quando voltar

um pedaço de mim é resgate
o outro é sorte grande, vida ou morte

abstenção, nicotina, culpa, redenção.

felicidade, prazer, tesão, sentimento, imagens bens construídas, quebra-cabeças.

parte de mim é o que falo
outra o que grito, que calo, que sinto.

aquilo que nasce ,
ou morre.

aquilo que desejo
e do que tenho medo

um lado é fita k-7
outro lado cd

no vinil arranhado de mim
lágrimas são acordes mais perfeitos
que alguém deseja escutar.

sobre escaladas e maremotos (II)


ainda pelo que me seja difícil admitir, o amor que sinto é dolorido como um tombo que se leva do alto da escada.
uma queda torturante do tipo que permite que hematomas se formem em todos os ângulos e extremidades - com algumas feridas abertas no decorrer do percurso.

o amor que sinto é dolorido de tão real que é. de ser assim sentido até no osso mais escondido e difícil de alcançar.

o amor que sinto gera dúvidas onde não existe motivo para duvidar. gera medo, desespero, pavor. medo de perder. desespero e vontade de arrancar os cabelos. pavor que faz nascer uma vontade incontrolável de arrancar as cascas dos machucados...

amor tão forte que ninguém, nem o objeto de todo esse amor, compreende.
amor que não se sente. amor que anestesia como uma cachaça braba que desce queimando a goela. amor que não se mede, metrifica, dimensiona.

não se dimensiona o amor e nem a loucura.

amor que não se sente à altura de ter atingido o limite máximo de degraus da escada
escada de onde caí (?) ou pulei (?).

parece complicado para você esse amor tão faminto habitar um coração?

sim?!

não, eu insisto que não!

entenda: um amor assim tão dolorido.
tão genuinamente sentido só pode ser
eterno.

12.1.09

Sobre cama, mesa e banho (IV)


(olhares.com)

parece que a gente é de plástico porque derrete na mesma hora em que o fogo acende. a respiração se posta ofegante e é o clímax. o frio deixa de ser azedo. calor se instaura no corpo feito febre alta.
é um ser tão profundo que nem todo o enjôo do mundo é capaz de atrapalhar.
é como uma pequena morte viva que pulsa nas veias e faz de nós uma única cor; vermelho.
sangue unido no despertar que nossos corpos representam no mundo de volumes, suores e formas. palavras certas. respirares errados. um único som e sentido até mesmo quando dormir tem movimento em cada noite, tarde ou manhã em que sonho em seus braços e me sinto mulher.

9.1.09

“A estrada da vida
pode ser longa e áspera.
Faça-a mais suave,
caminhando
e cantando...
com as mãos cheias de sementes.”


(Cora Coralina)

7.1.09

sobre nuncas e crises de ansiedade (VII)

da vontade de enfiar o pé na porta, derrubar tudo e como dizem por aí: “chegar chegando” surge uma pergunta para essa fútil existência: para qual lugar me dirigir enquanto sou digerida pelos sucos gástricos dessa vida atribulada de pensamentos perdidos e idéias brilhantes vagando pela mente?

é como se o vulto das coisas não realizadas ficasse sempre rondando enquanto as coisas realizadas param no tempo quando deveriam continuar em movimento. é aquela velha máxima de “águas passadas não movem moinhos”, pois viram xixi ou estão poluídas demais para subir com alguma força.

é aquela preguiça no meio da tarde e a vonatde de dormir depois do almoço. só que não!!!

não podemos dormir depois do almoço; aliás, não poderíamos dormir nunca e nem ficar sem fazer nada e nem parar um pouquinho para acender um cigarro e ter nosso “momento de reflexão”. não é possível parar. Como disse Cazuza: "o tempo não pára" e o suco gástrico dos dias nos consome com hora passadas, histórias erradas e lembranças equivocadas de situações e pessoas.

nunca fui “Poliana” e nem desejo ser, aliás, odiei ler este livro. foi o livro que mais odiei ler na minha vida. e “Poliana Moça”, então....me dá vontade de vomitar quando penso. essas leituras foram infinitamente piores que as obrigatórias para o vestibular, porque depois que passou a obrigatoriedade; li esses livros com gosto e são clássicos incontestáveis da boa literatura brasileira, mas “Poliana” não. é um tipo de auto-ajuda de mil novecentos e antigamente. uma lavagem cerebral para as menininhas serem obedientes e sempre contentarem-se com qualquer “merda”.

é aquele “do limão, faça limonada”. não! do limão faça mousse, caipirinha, esprema na tequila, no salaminho, no peixe, no camarão. misture com uma xícara de açúcar e faça um exfoliante!

bolas! estamos em 2009. quando acordarmos; em 2010 e por aí vai e faremos 31, 32, 33... e ninguém vai mais pular amarelinha com a gente e nem fazer campeonato de bolas de chiclete, aliás, o prazer de mascar chiclete já ficou para trás há tanto tempo...

o necessário é escrever mais livros para dar vazão a tanta coisa que você não falou na terapia e falar, falar, falar muito! aliás, falar não porque as palavras ficam vagando sem rumo e muitas vezes se perdem. a onda é escrever. escrever sobre o sério e também qualquer idéia ou crítica que o valha. colocar no papel qualquer observação importante sobre si mesma ou alguma frase qualquer. tenho feito trocadilhos e frases aparentemente sem sentido sobre o que sinto ou enxergo com meus óculos novos e sim estou feliz sem ter que fazer o jogo contente.

estar contente, aliás é a maior tristeza do mundo porque quando a gente está contente se contenta e o contentamento não é uma coisa boa porque na verdade a gente se conforma e não está pleno. a gente apenas engoliu mais um sapo e a digestão está difícil, mas a gente finge que está tudo bem levanta a cabeça e continua andando. lá vem de novo a “Poliana” a nos assombrar.

o suco gástrico dos dias nos carcome as entranhas e fica cada vez mais difícil respirar esse ar poluído por tanta insatisfação, portanto, “mãos à obra e pé na tábua. segue pra frente que atrás; vem gente”!

6.1.09

Sobre infância e liberdade (II)

sempre tive medo de calmaria,
mas nunca de maremotos
sei que por isso,
e só por isso,
vale à pena seguir nadando

mesmo que seja preciso engolir
litros e litros de água salgada
depois de tudo
sempre há uma xícara de chá quente
e um cafuné antes de dormir.

Sobre cama, mesa e banho (III)


da série: Felizes são as borboletas


era só ter atendido a uma das quatorze ligações.
eu não iria ficar achando que você estava "comendo uma putinha" e me emputecido.
é, eu estava com a chave de casa e claro que você não iria "comer uma putinha" na nossa cama. foi um choque abrir e porta. o quarto vazio e o celular a fazer trim-trim dentro da gaveta... claro que você não iria atender a uma das minhas quatorze ligações.
para você ver como eu lutei antes de pegar a mala e fugir sem olhar para trás - dei a última olhada, saí.
só hoje de manhã eu me dei conta que deixei para trás o meu perfume e com ele todas as coisas úteis; o meu cheiro, por exemplo.
deixei a porta aberta, as luzes acesas e espatifei o seu celular na parede.

se você tivesse atendido a alguma das minhas quatorze ligações, eu teria ido te encontrar no fim do mundo, no infinito, no inferno!

mesmo que você me confessasse ter acabado de "comer uma putinha", hoje, estaríamos abraçados e completamente de ressaca tomando água de coco na beira da praia, exalando sexo por todos os poros sorrindo felizes e, eu não teria esquecido meu cheiro e nem ralado meus joelhos.

ah! sim, não deu nem tempo de te contar que eu fui te procurar nas pedras e caí. sim, ralei os joelhos. eu poderia ter caído no mar e me afogado. você sentiria minha falta?

meus joelhos doem e estão inflamados e eu estou sentindo a minha falta. a falta de mim. falta de você e de tudo que a gente viveu e de tudo meu que você roubou: o meu paladar, por exemplo.

o meu sorriso também me faz falta e o seu sorriso...ah! seu sorriso sem explicação só por me ver e o seu sorriso leve depois do nosso fazer amor e até o seu sorriso sem graça quando você conta alguma piada sem graça.

eu tenho certeza de que este foi o fim, mas não! não existe fim.
foi só um recomeço.

não vou te ver agora, mas amanhã talvez e ouvir a sua voz e recuperar o cheiro, o gosto, o tato perdidos, pois minhas mãos só fazem sentido ao passear por teu corpo e teu pênis e tua nuca.

você poderia ter me avisado que não iria levar o celular e tudo estaria comum neste momento.

te amo para sempre. faz sol. sinto falta.

felizes são as borboletas. para elas, é sempre reveillon.

Sobre cama, mesa e banho (II)

(olhares.com)
diz que me ama,
pisca os olhos

coloca a língua para fora
lambe meu pescoço

e

me leva ao delírio
de uma fada
num parque
de diversões

Sobre cama, mesa e banho (I)

(olhares. com)


é uma dor boa de sentir
quando você me invade a boca
e morde meus lábios
e o fundo da minha língua

o útero responde com espasmos e beliscões
parece de vício
esse entorpecimento
esse sentir profundo

é um não entender
que se percebe

uma perfeição que se procura.

é raro esse sentir igual todas as vezes

essa saliva que se troca
é uma bomba que explode dentro de mim
e de ti

se isso é amor?