Encantamento
um cobertor de estrelas
aquece sentidos e sentires
numa noite clara
pela primeira vez o vi recitar poemas próprios, -
recapitulando...
na primeira vez que o vi. ponto.
ponto;
porque foi a primeira e só isso.
nunca o tinha visto antes,
nem ouvido falar sobre,
por isso
- a surpresa ao vê-lo ali-
no palco-degrau improvisado
com o papel na mão
a recitar poemas.
não estava nervoso
por ser sua primeira
também vez;
seguro de si
e do que tinha a dizer
[na verdade não precisaria falar]
mudo
acelerou meu coração
e me fez querer fazer música
ou ter asas,
ser fada para saber voar
ou ficar invisível.
meus olhos só perseguiam os dele
[perseguir, no sentido bom da palavra]
por instantes
enquanto ele falava o poema,
o mundo parou
e
como no cinema
as outras vozes ficaram inaudíveis
e só a dele se escutava,
somente ele eu via
[ver no sentido de enxergar e sentir]
fiquei arrepiada, com os olhos cheios d’água
como se tivesse acabado de aparecer na minha frente
um alguém que já fazia parte da minha vida
ou
talvez tenha feito em algum momento anterior
dezenas de anos, centenas ou milhares
[ou uma assombração].
pensando bem,
só pelo que me fez arrepiar,
mas não assustar
não poderia ser uma assombração.
na verdade,
o que assombrou
foi a maneira com que meu corpo e alma
entraram em estado de festa
depois de tanto tempo de clausura.
pela acomodação da vida,
eles estavam presos
e
libertaram-se quando ele surgiu.
ao vê-lo ali com a mão direita apontada para o alto,
levemente arqueada,
os cabelos negros em caracol,
sobrancelhas expressivas,
olhos que sorriam como se dançassem
foi paixão à primeira vista!
[paixão no sentido do “apaixonamento”, não se tratando de desejo]
não cheguei a desejá-lo como homem
não que não merecesse ser tratado assim
em forma de desejo
no sentido literal
do binômio “macho x fêmea”
-por tantas vezes incontrolável e indomável-
no sentido sexual do desejo
de levá-lo para cama
ou do deixar-me levar.
apaixonei-me instantânea e intuitivamente
por um anjo de asas escondidas
que despertou em mim desejo de levitar,
pentear os cabelos e sorrir.
desejo de ser um unicórnio,
ter poderes mágicos,
viver sem medos,
mágoas,
ansiedade,
tristeza
ou qualquer outra coisa que o valha.
estávamos ali,
só eu e ele
só a voz dele e o “tum-tum” do meu coração
os olhos e as estrelas ao redor.
a lua fez papel de holofote e
nem os travestis,
o grau etílico das idéias,
a algazarra e os celulares
fizeram com que eu saísse do transe em que me encontrava
efeito da hipnose provocada pelo olhar dele no meu
ou meu olhar no dele.
despreocupada com a ordem das coisas,
só me resta dizer que
depois, veio a vontade incontrolável
e daí a coragem para falar com ele
para dar parabéns, para agradecer,
para ouvir mais daquela voz
e oferecer um presente surgido de mim
como o livro meu
que coloquei
naquelas mãos
e foi tão bem recebido.
idéias minhas e dele
como elo, ligação
o falar e pensar de dois
utilizado como conexão de pensamento,
alma, vida, olhar, sorriso, calmaria,
asas.
sensação tão gratificante
quanto decifrar o segredo do cadeado
daquela arca empoeirada
e esquecida no porão
de um navio no fundo do mar
vontade de me jogar do alto da montanha mais alta
em direção ao mais verde dos vales.
encantada com a certeza
de ter conhecido um “ele”
que vê pessoas como seres humanos
e não como coisas
alguém que transforma palavras em anéis de diamante
e ondas do mar
um ser que sabe o que significa
sou
porque antes de tudo
ele é
e só é
porque se deixa ser
ele sabe que há muito mais em qualquer coisa que se faça,
em qualquer atitude que se tome,
em qualquer iniciativa
de colocar a chave
na fechadura
e abrir a porta
do que em simplesmente
abrir a porta.
um “um”,
mas não qualquer um,
que percebe a beleza em janelas abertas,
pássaros no céu
e café quente ao amanhecer.
feliz por guardar meu ontem como fotografia.
tranqüila no meio da festa
isso,
foi ele
e não por acaso.
não, por acaso,
não foi.
[será espero.]
...
seremos qualquer “algo”
que caia no olho feito cisco.
qualquer cisma
ou página amarelada de livro.
seremos com o tempo
qualquer "Baudelaire"
ou papel amassado.
estaremos como ontem
unidos
por uma linha imaginária
que não se desfaz
em raios de olhares,
velas sem pavio
ou
lâmpadas queimadas.
da série: "dancing in the moonlight"
ou
Um comentário:
Este singelo peregrino reverencia tuas mãos de jasmim na lágrima que, a mim, pede para nascer.
Postar um comentário