INTRODUÇÃO: Uma menina do meu trabalho vai ser formar em Design - a mesma profissão do Pai dela que morreu em 2002. Que como o meu pai morreu daquela doença. Daquele mal. Que começa com C e não se explica como pega - e a cura é difícil.
Ela me disse que falará na colação sobre os pais ausentes e na minha formatura - meu pai estava em coma e também não estava fisiacamente lá.
Escrevi esse poema para ela. Para ele. Mas também para mim e para meu pai- que esse mês faz 8 anos de ausente presença.
ausência não representa
não estar
presente
mesmo ausente
-presente alguém está-
seja em nossos pensamentos, lembranças
idéias,
coração
naquilo que identificamos
como nosso,
mas não um nosso
simples
-um “eu acho” , “eu concluo”-
e sim – um “concordo com ele”,
“ele me ensinou”
um
- “eu aprendi”-
aprender ...
-apreender-
é a mesma coisa que guardar lá dentro
do peito
algo que faz parte de você
-um pedaço-
tal qual as cicatrizes
dos nossos tombos de bicicleta,
o queixo rachado, o dente lascado
ou mesmo
o esmalte com o qual
nós meninas
pintamos a unha
– mesmo que momentâneo –
que mudemos de cor toda semana
a cor passa a fazer parte de nós.
sabemos disso
porque adquirimos
conhecimento
-com a convivência-
um saber
que a gente percebe
na fotografia
um olhar
emoldurado na memória
-aquele conselho-
um cartão, uma carta,
um presente
-os guardados-
um carinho guardado,
a música preferida,
aquele jantar especial,
a profissão
-as sensações-
o enxergar do orgulho nos olhos
a lembrança das mãos, do movimento,
as preferências,
os passeios
as lágrimas escorridas,
-o silêncio-
os sorrisos ao chegar em casa
e também os abraços de despedida
no meu coração
tem um buraco
que dói
quando venta
e esse buraco
vai sempre
sempre, sempre doer
-doer para sempre-
mas para sempre
terei certeza
que ele está presente
mesmo que eu não possa vê-lo
aqui na platéia
-mesmo que eu não o enxergue-
sinto que ele me olha
e sorri
e eu vejo uma lágrima tímida
a escorrer dos olhos dele
eu sei que ele
e todos os outros
e outras
que eu não posso ver
todos esses amores
que eu e vocês
-que nós-
não enxergamos
estão presentes
aqui na platéia
e que a ausência deles
é presença
em nosso coração que pulsa.
eles
nunca estarão ausentes
eles estão sempre aqui
-presentes-
dentro de nós.
Um comentário:
Também escrevi algo para meu pai que também foi diagnosticado por esse mal há alguns meses atrás, mas no estado inicial, tudo foi resolvido.
Força e luz pra vocês.
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