30.4.09

sobre olhos abertos e delicadezas (I)



Para Maysa Britto


não machuca. não ME machuca.


você quer sentir o que sinto para atestar que não machuca? sentir que não machuca?

você quer entender qual é o lance? a mágica?–

pois é,

se eu pudesse fazer um acordo com Deus para que nós dois (eu e você) trocássemos de lugar...


eu estaria subindo aquela colina, escalando aquele prédio, não estaria aqui.

confusa.


eu não estaria assim sob esse feixe de luz azul, desfocada, em cima de um palco

tão longe de mim

a tentar costurar sentimentos desconexos no peito

com agulha e fita de cetim.


eu, uma menina perdida na chuva.

uma menina que parece o açúcar de confeitar,

a calda da cereja.


que mostra emoções enquanto lava as roupas

em uma máquina de lavar quebrada

que

gira, gira, gira.


não estaria eu, aqui, quebrada e cheia de pseudônimos

perdida na chuva.


eu estaria subindo aquela montanha se eu pudesse fazer um acordo com Deus para que nós pudéssemos fazer a nossa contagem regressiva de coisas necessárias de procura, encontro – como uma balada anos 80 perdida no inconsciente coletivo do indivíduo-

-indivíduo enquanto ser produtor de sonhos malucos –


[situações improváveis]


como eu, menina, estar em uma casa desconhecida,

em um carro que anda sem rodas,

ou até mesmo,

perdida na chuva

a conversar com meu pai.


um coração não é a chuva. não é uma chuva.

não é um ladrilho rachado e nem um ralo de banheiro.


um coração não é um programa ordinário na tv e nem um filme ruim.

não é uma peça de teatro e nem a interpretação cheia de canastrice de um ator cheio de si.


um coração

não é uma música de despedida-

não é uma despedida-

não é uma música.


não é um grupo de axé pulando freneticamente no trio elétrico

e nem uma banda de rock quebrando guitarras num festival.


um coração é um pãozinho quente com manteiga que faz “croc-croc” de manhã,

um café-quente que aconchega

uma viola em volta da fogueira.

-cama só para dois-

e uma taça de vinho para acompanhar.


é uma lingerie nova

um pomar de frutas doces

um beijo apaixonado

uma promoção no emprego

a viagem de férias.


o coração não machuca.

o coração SE machuca.


não machuca.

ele sente a martelada que machuca.


um cérebro pode machucar um coração

um tapa

uma desilusão.


outro coração? não!


não é possível um coração machucar outro coração.

o coração não machuca.


um cofre na parede não machuca.


[o coração é um cofre onde se guardam os afetos partidos.]

29.4.09

The saddest part of a broken heart isn’t the ending so much as the start.

-Feist

http://www.sanpablo-sp.blogspot.com/

Poema do LEPREVOST

notas para um livro bonito



meu coração
é uma daquelas árvores
em que alguém
com um canivete
talhou outro coração.
esse outro é o seu.

28.4.09

Madame Kaos - Versão 2009 - no VERSOS DA MEIA NOITE


(CLIQUE NA IMAGEM PARA AUMENTAR)


Dia 7 de maio, 2009 - às 23h - na caixa de fósforos "FOSFOBOX" mais eufórica de Copacabana - Gean Queiroz pilota o VERSOS DA MEIA NOITE , o evento poético mais rock'n roll dessa cidade (junto com o CEP).

Meu grupo, Madame Kaos, é uma das atrações, e também retorna de um período de "férias" (desde de dezembro de 2008 não fazemos uma apresentação). Então é um retorno em dose dupla, imperdível! (pra acompanhar uma dose dupla de qualquer bebida forte cai bem...).

27.4.09

sobre acaso e cachos de uva (II)


DA SÉRIE: " I am not for sale before I am sold".

atravesso o corredor
que é um mundo

o universo

um caminho de escolhas

casa de espelhos;
de faltas.

é longo o corredor da vida
assim como podem ser longas
as unhas, os cabelos, as frases.

as despedidas
as frases de despedida.

o choro também. e as lágrimas, lamúrias, cicatrizes, cortes.

assim como são grandes
os amores
longas
as paixões.

paixões, respirações, unhas e faltas.

como é longo o sentir falta.
os aprendizados,
as lições

assim como
são longas as canções de amor.
os poemas
de amor. as cartas.
estrofes.
os versos, os filmes,
as trilhas sonoras,
os minutos...

como é longa a busca
- linha tênue -
entre a surpresa, o desejo,
a certeza.

o equilibrar-se no fio de aço da espera
entre o encontro, a certeza,
o desafio,
a surpresa.

sem rede de proteção
as sapatilhas gastas
da bailarina
equilibram-se
por entre pés doloridos
e uma linha gelada
de aço

como pedra de gelo
-sob meus pés-

característica, gelada
e sem tamnho definido.

os pés da equilibrista têm bolhas
e rachaduras
como um solo árido
ressecado pela falta das chuvas.

arame do aparelho fixo
que aperta os dentes
e machuca gengivas
até sangrar.

meus pés sangram de espera.
meu coração sangra
de espera.

arranquei minhas unhas

sangrava
de espera.
meu vestido rasgado, sangrava.

eu atravessei o corredor
enquanto poças vermelhas
formavam-se
sob meus pés.

meus dentes e olhos sangravam
de espera.

já se fazia tarde
e a cama aflita
de espera.

o corredor sangrava
[de espera]
borboletas voavam
chuva caía
a manhã se anunciava
e os mendigos
dormiam.


espera. espera...
me espera.

ei!
me espera chegar ao fim
do corredor
para te encontrar.

sobre novos rumos e um voo de gaivota (I)

montanha-russa

sobe descem rápidas 
as ilusões

por isso,

sempre tive
medo

sobedesce rápido 
de ilusões
que não 
obedecem

ilusões não obedecem anseios
não dão desculpas
nem pedem licença

ilusões entram.

invadem o peito. a alma e as solas dos pés.

ilusões são um movimento revolucionário; involuntário
não pedem desculpas, nem licença
e não dizem
obrigado.

ilusões são breves, rápidas, efêmeras
como uma prece
ou algo em que se acredita
piamente.

ilusões não fazem joguinho,
não enganam,
não mentem

são "o isso aqui"
o "vamo vê"
o "até breve"

ilusões são breves,
rápidas 
como uma prece

não se arrependem
são breves, rápidas,
lúcidas, 
sóbrias, efêmeras
-como uma prece-

não pedem licença
não inventam desculpas

são uma montanha
russa.

Sobre acaso e cachos de uva (I)


há muitas ilhas e olhos neste apartamento.
o teto me achata, as luzes balançam e me jogam de um lado para o outro
tal qual o alto mar faz com o transatlântico em dias frios
-chacoalha-
balança - navega,
bate. joga.
de um lado
para o outro.

lá e cá -
as lâmpadas sacolejam
as copas dos abajures...

há trilhas, caminhos, montanhas
nesse apartamento.

olhos também.

há muitos olhos neste apartamento.
muito você, eu e nossos óculos.

no meio da sala eu escalo, navego, corro.
faço cooper.
eu faço cooper nesse apartamento.

há muitos espaços vazios.
há um vazio repleto de quinquilharias;
nesse apartamento.

há muitos móveis por aqui e mares, montanhas e ilhas.
muito de nós.

pouco, pouquíssimo de mim.
quase nada de você.
e muito de nós.

há escadas rolantes e cinzas de cigarro nesse apartamento
e um gerador de energia
embaixo da cama.

os lençóis estão limpos;
a cabeceira vazia.

muito de nós por aqui
e nada de mim -
nem de você.
apenas vestígios de cacos e copos quebrados pelo chão
-nenhum chinelo aqui por perto-
cacos e cacos. giletes pelo chão e muita dor em mim
e
em você.

há uma vontade enorme de acertar dessa vez o estilo de decoração.
nem indiana, naif e nem elaborada demais.
vontade de acertar na decoração desta vez.

o apartamento está vazio, mas cheio
cheio de mim
- e-
de você.

sobre conjugações verbais e contestações (I)


tem dias em que a gente quer. qualquer coisa, mas quer. simplesmente quer.
quem quer, sempre, quer alguma coisa - assim como quem beija beija alguém.

só que tem dias em que a gente simplesmente quer! - assim como eu hoje acordei querendo.

e hoje eu quero! - assim- a mesma coisa que "amar verbo intransitivo". eu quero - verbo intransitivo. simplesmente quero.

sim eu quero.
acordei querendo querer. quero. simplesmente quero. assim como o passarinho - quero-quero.

o "quero- quero" quer. ele não canta: quero-isso; quero-aquilo; quero-aquiloutro.
ele canta; quero-quero. ele simplesmente quer.

assim como eu hoje acordei;
querendo.

Ana Cristina Cesar

A Ponto de Partir

A ponto de
partir, já sei
que nossos olhos
sorriam para sempre
na distância.
Parece pouco?
Chão de sal grosso, e ouro que se racha.
A ponto de partir, já sei que nossos olhos sorriem na distância.
Lentes escuríssimas sob os pilotis.

24.4.09

sobre paraísos e diálogos imaginários (III)


eu queria tanto,
mas tanto
tanto, tanto...
que você tivesse algum tempo para mim.

um tempo para ouvir minhas idéias e sentir minha respiração. um tempo para criticar minhas idéias, dirigir minhas idéias...
para me dar a mão e aceitar minhas idéias e dirigir minhas idéias e digerir minha presença em sua vida. sua presença em minha vida.

um tempo para alimentar esse vazio lacuna, abismo, ponte tombada entre nós dois.

um tempo para me entender, conversar e escutar as batidas do meu coração. - mas, seria tudo um engano, sabia? mais um engano. outro equivoco em nossa existência. em nossa i-n-s-i-s-t-ê-n-c-i-a.

porque mesmo a gente se conheceu? como mesmo; a gente se conheceu? a gente se conheceu? porquê?
porquê a gente se conheceu?

ah! lembrei! para você brincar comigo feito gato e rato. me fazer de gato e sapato; me sufocar.

tem dias em que eu desejo um tempo seu para mim, mas depois penso que isso seria idiota, infantil e inadequado como nós dois e a nossa história. a gente teve história?

tem dias em que eu queria um tempo seu para ouvir minhas idéias, mas isso, seria um engano. mais um. mais um de tantos...
isso seria um erro. mais que isso; uma necessidade de me enterrar mais fundo. de me enterrar viva. um equívoco. mais um - equívoco.

sobre aritmética e selvageria (II)


queria encontrar
você
para te morder
como cachorro bravo
guardião de patrimônio alheio

morder para demonstrar
defesa

para me defender do sentimento
que invade
os dentes até a alma
e faz minha boca
espumar de raiva

[não a doença; o sentimento]

Entenda: a raiva não seria de você
mas a fome que sinto
é tão grande...

não seria um morder para machucar
dilacerar, arrancar pedaço
desfigurar
e nem um comer para saciar a fome

seria uma mordida
[arranhão leve]

alerta de que algo está errado
com a gente
[com você e comigo]
uma mordida para acordar

cansei de restos de comida
ração e água com mosquitos
no potinho

e também não me apetece
caviar Beluga, escargot
e nem salmão

[não preciso de muito]

o que preciso é muito pouco
[apenas que você acorde]

um arranhão
um piscar de olhos
um aceno
meia dúzia de palavras
e um sentido para o meu sentir

uma direção
para o sentimento
desgovernado
que me faz rosnar
como cão raivoso
e passar tardes
cavando buracos
à procura de um osso
costela

[vestígio seu]
no quintal

sobre paraísos e diálogos imaginários (II)


o importante é parar


...de andar. de sentir. de chorar. de correr. de comer. de beber água ou outro líquido que invada a garganta feito cachoeira.


importante não parar...


de olhar. de morder os cabelos. de sorrir. de querer morrer. de querer viver. de pensar nas coisas. na vida. no efêmero. no utópico. no lúdico.


importante não


...correr. fazer abdominal. maquiar os olhos. suar. sofrer. gemer. borrar os olhos. encher a cara. assistir tv. ver bons filmes; de arte. ser arte. fazer arte. pensar arte. subir – na balança. balançar as cadeiras. subir no balanço. me colocar gangorra - no caminho dos outros.


importante


derreter como sorvete no sol escaldante. derreter. é importante derreter. deixar-me derreter. desintegrar.


importante não esquecer. esquecer. escrever. aquecer. deixar-me livre. à solta como um animal selvagem que fugiu do circo. como um bichinho de estimação que só come se tiver comida; que não caça. não procura.


importante procurar. encontrar. jogar fora. voar. livrar-me de. qualquer coisa que abale as estruturas de um prédio ou deixe subitamente de abalar. tal qual explosivos na obra do metrô. holofotes na cara dentro do teatro. importante desviar.


sair de. saber deixar para trás. as chuvas de verão. as flores murchas. as laranjas apodrecidas. os dentes amarelados. importante enterrar sentimentos num mausoléu de mármore preto. visitar entes queridos. amigos. importante lembrar de.


não sorrir. deixar de ser. pateta. palhaça. destrambelhada. maluca. deficiente visual. importante. importante. importante é o nada e todos os buracos vazios.


choques elétricos. vestidos rasgados. trilhas sonoras tristes. importante toda dor e o amor. o amor.

Sobre demolições e água na boca (IV)


quem somos nós para entender

o amor está preso

nas gavetas, frestas, tapetes


[é poeira engolida pelo aspirador de pó]


descansa no filtro de pano

misturado com fios de cabelo, miçangas

e pêlo de cachorro


[restos de incenso, cinzas de cigarro]


o amor é uma sujeira

que permanece

e por mais que a diarista insista

em tirá-lo do meio da sala

não consegue


ele é transportado pelo vento

mistura-se ao movimento da casa,

entra pelas janelas

que são mantidas abertas

para ventilar


não tem rodo, pano de chão

e nem detergente

que limpe esse assoalho sujo

chamado amor


ele continua vivo

nos cantos da sala,

nas frestas e embaixo das estantes


ele é um fracassado,

um parasita

e não desiste

de reaparecer sanguessuga

nas gavetas encharcadas de sangue,

sujeira e dor


no coração


23.4.09

sobre rebeldia e unhas vermelhas (I)



palavras em ebulição
bolhas de água
quente
pulam e estouram na tampa
da panela 
feito lava viscosa de vulcão

vermelho. de um vermelho vivo.
quase laranja.

quando esfria; se faz cinza
chumbo. grafite
lápis número 2
de fazer prova

preenche assim 
o simulado 
burro e impossível
de um coração
de desenho simples
sem lados
e sem instrução

um coração esburacado
que já foi roxo
de tanto chute que levou na escola

ele era rebelde
e não usava uniforme
nem acatava ordens

recebia advertência na  caderneta
e sabia falsificar a assinatura dos pais

seu lábios, boca, língua
serviam só para beijos e alimento.

palavras mudas
em ebulição
paletta infinita
de cores de batom

[misturas]

um porto sempre errado para atracar
navio sem bússola
nem leme
sem mapa

ebulição
mar bravio
um vermelho tão vivo 
quase laranja...

brilho acinzentado 
feito
a morte

olhos de lâmpada triste
queimados
 

22.4.09

Caio Fernando Abreu

"Chorar por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, pelo que perdi de mim, pelo ontem morto, pelo hoje sujo, pelo amanhã que não existe, pelo muito que amei e não me amaram, pelo que tentei ser correto e não foram comigo. Meu coração sangra com uma dor que não consigo comunicar a ninguém, recuso todos os toques e ignoro todas tentativas de aproximação. Tenho vergonha de gritar que esta dor é só minha, de pedir que me deixem em paz e só com ela, como um cão com seu osso.
A única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso. A única magia que existe é a nossa incompreensão."

17.4.09

Sobre ser ... (I)


...uma flor


se eu fosse uma flor
não seria abstrata
não teria vontades perdidas
nem medo da morte

a pressão não seria baixa
nem sentiria calor.
pensamentos seriam orvalho
fome
sede
água da chuva
evolução? seria pólem
beijos? picadas de abelha

dor?

só se arrancassem pétalas
ou me deixassem só
numa sala
no meio da mesa de centro
para emoldurar brigas,
saudade e indiferença.

num vaso com água parada e larvas; talvez até fosse feliz
não passaria a vida contemplando mentiras num porta retratos
nem procurando holofotes de atenção

tentando encontrar presentes encantados
em ruas escuras
e nem amores verdadeiros
em promessas vagas
de talvez.

Sempre "meu" velho...

"Na vida há coisas muito piores do que ficar sozinho,
mas geralmente só percebemos isso quando é tarde demais,
e não há nada pior do que tarde demais."

Charles Bukowski

Sobre o que sentir (I)


difícil separar o furacão que rodopia no estômago

da tempestade que cai e recolhe fragmentos,

restos de comida, fagulhas, sucos gástricos, líquidos, cheiros, fluidos corporais

e transporta tudo para a mente.


[carrossel de palavras. lembranças. gritos.]


na pele, resquício de suor, cheiros, pêlos, poros.

corpo inteiro - ao meio- perdido no mar agitado

[ onde parou o furacão]


até parece que o afastar-se da costa, das costas, é alguma solução.

não existe solução. tudo tão confuso...


sorriso seu que é dele, idade sua que é dele, compleição física sua

[tão dele]


eu não sua e nem dele

jeito, grito, voz, palavras, cheiros... tudo tão dele.


tudo tão

nenhum pouco meu

- não mais meu-

nunca meu.


[tudo na lembrança]


eu

perdida em lembranças


braços dormentes de lembranças. mente cheia de lembranças

e não é saudade.


tudo tão similar que fica confuso

até seus olhos fechados,

seu jeito de dormir...

tão dele.


tão

nenhum pouco

meu

– feito ele.


[os três tão de outros...]


furacão rodopia no estômago


a tempestade

encharca o todo

tudo


tudo lá

tudo


[nada]


em mim.

16.4.09

A necessidade sexual é ainda mais fundamental que a fome pelo fato de ligar cada indivíduo à espécie. Pela sexualidade o próprio querer-viver se afirma no indivíduo por intermédio da espécie, ou mais exatamente na espécie por intermédio do indivíduo e além da existência individual. Eis porque importa ver no instinto sexual “o apetite dos apetites”. Jamais se poderá insistir bastante sobre sua potência e sua onipresença.

Jean Lefranc, Compreender Schopenhauer (Vozes, pg. 133)

14.4.09

Sobre paisagem e movimento (VIII)


vício consome memórias inapagáveis do cérebro
e processa lembranças, tremores e faltas

fatos impedem a liberdade de voar, sorrir
e esquecer
de algum fator subtraído
inutilmente
quando a dor de cabeça
esquenta com microondas
partículas
de uma foto mal tirada
com máquina digital

13.4.09

sobre desafios e tons pastel (I)



DE SÉRIE:
quando me vesti de esperança

não é da cor verde que estou falando e nem do bicho que parece um grilo e não faz barulho. muito menos de um pedaço de grama ou corte no dedo - que faz com que gotas vermelhas coloram de vermelho um pedaço de papel qualquer.

o que pode ser “clichê” - quando nos colocamos no meio de um furacão e sentimos nossa respiração mais rarefeita diante de qualquer suspiro mais profundo(?). quando nos deixamos – permitimos- ser guiados por um impulso – uma vontade tão grande de deixar que palavras voem de nossa mente como se fosse imprescindível nos livrarmos de uma angústia entranhada, escondida, endurecida – em qualquer canto – e isso, nos faz sentir pequenos - como se esse sentimento fizesse parte de nossa pele ou órgão interno.

muito pior até – é como se isso tudo, fizesse parte do nosso cérebro e dessa forma– utilizasse mecanismos extremos para nos matar pouco a pouco.

longe de depressão, mas nesses últimos dois dias, tenho tentado expurgar com uma certa doçura até – esse vômito que como parasita, se grudou em mim.

vivenciei umas coisas, escutei umas palavras – que me fizeram sentir pequena - e isso de alguma forma acordou um demônio (!) - minha necessidade de saber que essas vivências, certas palavras, brigas – são desnecessárias.

como para me desintoxicar – de um vício que me consumia – pensei em como essas palavras, dizeres me faziam e fizeram mal.

uma incoerência, prepotência tão enormes sabe – uma cegueira tão maldosa- tão vil – dentro de uma convivência com alguém como eu, que dá extremo valor às palavras – e meu eu ter que ouvir que palavras não são importantes... isso despertou minha ira e agora me visto de esperança.

quando digo isso, não estou fazendo nenhuma referência à cor verde.

azul e rosa sempre foram minhas nuances preferidas
por isso,
agora-
faço questão de ser lilás.


sobre reflexões e choques elétricos (I)




Impulsos são ações que nos tomam de assalto e impedem os pensamentos de voar mais alto. Palavras são redes de prender e costurar pensamentos ou libertá-los. E é assim que me permito andar, mesmo que descalça, de havaianas ou com meus "scarpin" Prada.

sobre cor de rosa e destilados (I)


não posso mais falar do meu amor


esse amor

que escorre pelos dedos

feito água suja

que cai do céu

enferrujada


à conta gotas

devagar


amor que não faz baliza

não estaciona

não pisa no freio

não pára

nem entra em vaga


amor que vaga

e desnudo aparece

no salão mais careta

do baile de formatura


amor pelado

sem vergonha

nu

à mostra


não posso mais falar

preciso não sentir


difícil deixar para trás

certas coisas


esquecer


o meu amor

é um palhaço kamikase

que toma litros de saquê

rodopia num avião de guerra

e não consegue

enfiar a espada no peito


[seria perfeito

se ele conseguisse

enfiar a espada no peito]


mas não

ele grita, esperneia, esbraveja

respira fundo

se enche de coragem

e não passa de um ridículo

quando desiste

e volta a bater

dentro do meu coração


no pensamento

nas veias

e em vários momentos do meu dia.


é preciso ficar calada

para que a situação

se modifique

e eu deixe de me sentir

como uma trouxa de roupa

suja

esquecida no canto

de um quarto

inabitado



DA SÉRIE: é necessário que esse amor deixe de estar vivo para que eu recupere a minha paz.

8.4.09

sobre desapego e fogos de artifício (I)


não tenho mais armas para lutar.
as suas são tão mais potentes e afiadas...

minhas facas além de cegas perderam a ponta e estão enferrujadas.

suas armas são tão maiores que as minhas e a minha luta é grande demais para meus ombros e estatura.

ando curvada e não é mais possível lutar.
meu grito está preso e meus braços; cansados.

no momento é preciso que eu desista dessa guerra perdida.
não posso mais machucar-me.
não há mais espaço para cicatrizes na minha pele.

meus ossos estão quebrados,
meus nervos em frangalho,
meus olhos já sem brilho
e na mente
uma rebelião de palavras
que para você
não importam.

sou preocupada com as palavras.
dou valor a elas.

você não pode me dizer agora,
depois de tanto tempo,
que palavras
não são importantes.

nós dois juntos há tanto tempo
e agora
percebo seu pouco caso com as palavras.

eu pedi para que você as retirasse e não fui escutada.
mais uma vez, você não me ouviu.

fica difícil para mim
- quase impossível
entender -
e
por isso,
entrego minhas armas.

não vou mais lutar.
não tenho mais força.

minhas lágrimas estão em alvoroço querem a libertação.

então eu choro,
digo adeus,
sinto saudade.

Sobre demolições e água na boca (III)


é tempo de fingir,
de mentir,
dissimular.

portas e janelas
dormem
e sonham
com alguma ventania
que as faça abrifechar

desejam algum barulho,
volúpia,
insistência!!!

é urgente que um pesadelo
as desperte
ainda de madrugada
como frase fora de contexto
em briga de namorados

mistura que machuca o paladar
de baunilha e hortelã
em qualquer coração
desesperado e pré-disposto
a sangrar feito gengiva
após cirurgia de ciso

sofrer lembranças amargas
até o fim dos tempos

até o total esquecimento
de tudo que por ventura
se fez bom

todo entorpecimento,
espera
e soluços.

é tempo de fingir,
dissimular e
esquecer

escovar os dentes
tomar um calmante
acordar sem olheiras

para no dia seguinte
posar para novas
fotografias.

7.4.09

sobre sujeira e interrogações (II)


descargas elétricas
raios e choques
revelam
o que devo sentir

-formigamento do agora-

momento de desespero
no deserto

fraqueza
não esperança;
franqueza

braços, dedos, mão
adormecidos

-ilusão latejante-
pior que queimadura

fogo, carvão em brasa

-subjetividade-

ataque de formigas
sentimento
projetado na parede
do banheiro

área nobre
onde se faz possível
descarregar imperfeições,
vergonhas

local onde podemos perceber
se continuamos saudáveis

lá, contabilizamos
anos de vida
ou proximidade da morte

-água-


escorrer pelo ralo
tal qual impureza
é o mesmo
que jogar
o secador na banheira

- morte certa-

choque elétrico
destruição de medos
sem direcionamento

algum lugar
diferente da Av. Atlântica
ou de dentro de você

qualquer lugar
com postes sempre acesos,
sirenes de polícia e
esquinas imundas

6.4.09

sobre sujeira e interrogações (I)


insetos sobre pedras portuguesas
a calçada está viva
vive do chorume do lixo,
das solas dos tênis dos playboys,
das gladiadoras das meninas
e das havaianas dos turistas e locais.

o gás carbônico dos carros
-poluição-
organismo vivo
de impurezas
“Manolo’s Blahnik”

sapatos dão dois passos
e param
entram em carros blindados
habitando assim
nova superfície

- não mais limpa, nem menos suja –

microorganismo,
microcosmos
[onde também encontramos insetos
sobreviventes de bomba atômica]
-holocausto-

outro lugar não menos vivo
ou mais morto
- morto como o mar-

o mesmo mar
de onde podem surgir ondas
novas, plásticas,
límpidas
azuis claras, escuras,
royal, turquesa
ou marrons
recheadas de esgoto, espuma,
pedaços de plástico,
algas

ondas tão tais
onde
podem nadar
baratas.

4.4.09

sobre aritmética e selvageria (I)


talvez nunca encontre
no outro
o que percebo em mim

e não seja escondido
de mim
o que perco
no outro

a sorte pode ser algo
parecido com uma festa surpresa
ou de alguma forma,
cera de vela
derretida
no bolo de aniversário

o que
eu mostre
talvez,
não seja espelho
de alguém

uma página em branco
e milhares de lápis de cor
tinta guache, massa de modelar

[nuances de sorrisos e lágrimas]


qualquer sorte
no acaso

uma dúvida na pergunta:
- a resposta.

3.4.09

Sobre demolições e água na boca (II)

Da série: questionamentos.
ou
sobre perder a utilidade e/ou necessidade de reciclar


em algum lugar há uma porta escancarada mantida aberta por uma tartaruga de areia. vejo a minha tartaruga, hoje, furada e a areia que a recheava espalhou-se pela casa - a bagunça, preenche a maior parte do ambiente.


tudo tão vago e infantil num medo que se percebe além de qualquer sentimento. algo impossível de ser percebido - de repente - numa simples e inocente troca de aspirações, gostos e modernidades.


o gosto por ser livre escondido nas frestas.


vento que chega com força e espalha cacos de vidro e poeira pela casa. a sujeira encontra os olhos e produz lágrimas tristes. faz com que elas escorram por um rosto que iluminava-se com o brilho de algumas palavras compartilhadas.


o medo, a falta de tempo ou o desinteresse, percebidos num elogio vago. num desejo manso de que o outro fique bem sem ti. uma verdade que machuca como legumes e frutas amassados no fim da feira.


desperdício. última garfada deixada no prato. um gole esquecido no copo. pressa e tempo de mãos dadas correm e acabam por afastar abacaxis de suas cascas.


sensação de vazio

como a tartaruga de areia

(esvaziada)

que

-mantinha a porta aberta -

hoje é pano de chão.