27.4.09

Sobre acaso e cachos de uva (I)


há muitas ilhas e olhos neste apartamento.
o teto me achata, as luzes balançam e me jogam de um lado para o outro
tal qual o alto mar faz com o transatlântico em dias frios
-chacoalha-
balança - navega,
bate. joga.
de um lado
para o outro.

lá e cá -
as lâmpadas sacolejam
as copas dos abajures...

há trilhas, caminhos, montanhas
nesse apartamento.

olhos também.

há muitos olhos neste apartamento.
muito você, eu e nossos óculos.

no meio da sala eu escalo, navego, corro.
faço cooper.
eu faço cooper nesse apartamento.

há muitos espaços vazios.
há um vazio repleto de quinquilharias;
nesse apartamento.

há muitos móveis por aqui e mares, montanhas e ilhas.
muito de nós.

pouco, pouquíssimo de mim.
quase nada de você.
e muito de nós.

há escadas rolantes e cinzas de cigarro nesse apartamento
e um gerador de energia
embaixo da cama.

os lençóis estão limpos;
a cabeceira vazia.

muito de nós por aqui
e nada de mim -
nem de você.
apenas vestígios de cacos e copos quebrados pelo chão
-nenhum chinelo aqui por perto-
cacos e cacos. giletes pelo chão e muita dor em mim
e
em você.

há uma vontade enorme de acertar dessa vez o estilo de decoração.
nem indiana, naif e nem elaborada demais.
vontade de acertar na decoração desta vez.

o apartamento está vazio, mas cheio
cheio de mim
- e-
de você.

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